A Educação em tempos de transformação digital

Texto: Márcio Camargo, M.Sc.                    Foto: Coyot (Pixabay)

Uma revista de negócios apresentou uma entrevista com Loïc Hamon – líder do Comitê Executivo da GE Digital na América Latina que falou sobre uma decisão ousada da empresa, eles decidiram isolar o time de inovadores do restante dos funcionários da companhia. Ele declara que essa atitude tinha por objetivo blindar a equipe já que a empresa possui 127 anos de história e construiu ao longo dos anos uma cultura muito sólida e por isso mesmo as pessoas de mentalidade digital poderiam ser rejeitadas pelo “sistema imunológico”.

Ele cita que com essa atitude, o time digital começou a formar sua própria cultura e, a partir daí as pessoas desses times começaram a conquistar a empresa e se integrar às equipes e aos negócios existentes.

Não tenho dúvidas que estamos passando por uma transformação digital gigantesca e que as empresas que não se preocuparem com esse assunto, poderão perder o “bonde” da história, a exemplo de muitas grandes corporações que ruíram e viraram pó, simplesmente por não entenderem a necessidade de se reinventarem.

Ouço muita gente falar de inovação, tenho estudado um pouco esse assunto e entendido que as previsões para o futuro são assustadoramente interessantes e às vezes, não vou mentir, me pego verdadeiramente sobressaltado com tudo, sem entender ainda grande parte daquilo que será o nosso mundo amanhã.

Mas eu quero fazer uma pequena reflexão sobre esses novos tempos nos processos educacionais para adultos.

Para onde vai a educação? Como fazer uma educação de qualidade que possa exponenciar e atingir a todas as classes sociais e todos os níveis desse nosso tão grande país? Como desenvolver aulas que possam verdadeiramente apoiar o desenvolvimento das pessoas e estimulá-las? A educação a distância é uma alternativa viável?

Não tenho todas as respostas, mas quero aqui refletir sobre algumas questões que entendo, podem responder em parte essas questões e quero começar refletindo sobre a educação presencial.

A educação tradicional presencial passa e passará por uma grande transformação. As aulas tradicionais e o jogo de 489 slides acabaram e estão dando lugar ao storytelling, às discussões em pequenos e grandes grupos, ao estudo real de problemas, à exposição de práticas reais das empresas e organizações. As fichas amareladas e gastas (sim aquelas que alguns professores até hoje se utilizam) darão lugar à dialética e à maiêutica socrática, a exemplo das aulas do prof. Michel Sandel, que provoca nos alunos que lotam o auditório de Harvard, a reflexão de temas profundos instigando através de questionamentos, sem chegar necessariamente à conclusões predefinidas ou terminais.

Não tenho dúvidas que as longas aulas expositivas darão lugar à discussão, à participação e à construção coletiva de aprendizados e reflexões. E muitos pesquisadores tem apresentado estudos que revelam que o ideal é que o professor altere a metodologia de aprendizagem, o assunto, o modelo de aula ou até o formato da sala a cada 20 minutos no máximo, que é um tempo razoável para a atenção concentrada dos alunos. Declaram ainda que o ideal é mudar de tempos em tempos o foco da pessoa que está em evidência na aula, levando o foco para os próprios alunos ou invés de ser única e exclusivamente do professor.

Já a Educação a Distância, o famoso EAD que si iniciou no Brasil como cursos por correspondência antes de 1950 e teve como um dos ícones o famoso Instituto Universal Brasileiro, não tenho dúvidas deixará definitivamente de ser somente complementação dos cursos presenciais e terá sua própria metodologia e modelo próprios. Aliás, isso não pode ser expressado no pretérito, mas sim no presente pois a educação a distância tem passado por constantes e grandes evoluções. Muito se tem estudado sobre o assunto, muitos artigos são escritos e muitas tentativas e projetos são apresentados em congressos. O mais interessante é que ainda hoje, apesar da evolução claramente observada, ainda conheço instituições e educadores que oferecem cursos no modelo “EAD” filmando suas aulas presenciais tradicionais e transmitindo o conteúdo. Esse modelo tende a ser cada vez menos utilizado já que EAD não é isso, ou pelo menos não é só isso. Isso para mim é complementação de educação presencial e não educação a distância.

micro learning, ou as pílulas de aprendizagem, são alternativas viáveis para o EAD nesses tempos de “vida corrida”

A Educação a Distância que sobreviverá nesses novos tempos é aquela elaborada especialmente para o modelo “não presencial”. E para isso atualmente o que se fala muito é sobre o micro learning, ou seja, aulas de 5 ou 6 minutos, com início, meio e fim, que tratam de um assunto específico e que estimulam o estudante a buscar mais informações e de forma autônoma enriquecer seus conhecimentos no tema. Cada participante poderá, inclusive, buscar uma trilha diferente de aprendizagem, uma trilha que atenda aos seus objetivos e propósitos, que poderá ser diferente de todos os outros participantes. Um conjunto dessas pílulas pode se tornar uma disciplina de um programa mais longo. E nesse modelo poderemos ter programas de pós-graduação inteiramente não presenciais com qualidade educacional, compostos por trilhas individuais de aprendizagem.

micro learning, ou as pílulas de aprendizagem, são alternativas viáveis para o EAD nesses tempos de “vida corrida”. O fato é que poucas pessoas aguentam ficar mais que 15 minutos no smartphone ou no notebook ouvindo um facilitador de aprendizagem ou professor apresentando um assunto, por mais interessante que esse seja.


A grande questão que surge é: então devo abandonar os processos educativos tradicionais e mudar toda a minha instituição para modelos híbridos e em EAD? Paro com o que está dando certo no presencial, com as aulas tradicionais e sigo um novo caminho? Fecho tudo e monto uma startup? Mato meu negócio antes que outros o matem?

Algumas dessas perguntas ouvi dias atrás de um profissional de Recursos Humanos de uma grande multinacional e a minha resposta foi NÃO, não acredito que tudo tenha que ser radicalmente alterado.

Essa minha resposta foi alinhada com a crença que não precisamos fazer uma virada total em tudo, mas que podemos coexistir em dois modelos, ou seja, aquilo que funciona no atual modelo deve ser continuado e intensificado, e paralelamente devem ser buscadas metodologias inovadoras que atendam aos novos paradigmas da educação.

Toda essa reflexão girou em torno de uma instituição educacional que tem auferido sucesso com seus programas presenciais e também no modelo EAD tradicional,  mas que tem preocupação sobre como crescer e inovar na educação de adultos, oferecendo programas mais acessíveis para profissionais de todo o país. Lembro-me de ter lhe oferecido alguns caminhos para que os programas fossem desenvolvidos no modelo EAD, mesmo nas disciplinas que exigem experimentação técnica, como por exemplo, a instalação de polos regionais para essas aulas, onde o deslocamento se dá somente pelo professor que utiliza kits de aprendizagem, evitando assim que muitos alunos se desloquem, para poder se desenvolver e aperfeiçoar suas técnicas. Isso sem contar com o custo mais baixo do deslocamento de uma pessoa, ao invés de 50 ou 80.

Verdadeiramente eu acredito que essa pode ser uma forma viável de levar educação e formação a mais pessoas, em todas as áreas do saber e me arrisco a dizer que, inclusive na área da saúde. Imagine profissionais de lugares distantes dos grandes centros de ensino e pesquisa, tendo a possibilidade de acesso à modernas tecnologias na saúde, estudos clínicos contemporâneos e a conteúdos de ponta. Imagine como poderemos transformar a vida desses profissionais e a grande possibilidade de melhoria qualitativa nos atendimentos de saúde.

Disse-lhe finalmente, a partir de toda a reflexão que fizemos que esse modelo não precisaria, necessariamente, acabar com os programas presenciais tão bem desenvolvidos na instituição, ou trocar toda a equipe envolvida com os processos educativos, mas que entendia ser necessário a montagem uma nova equipe, com mentalidade digital, talvez apartada do time atual que busque a inovação disruptiva e que desenvolva e teste novos modelos, colocando-os em funcionamento, através de metodologias diferenciadas e atuais.

Quando li a entrevista entendi que não estou tão errado em minhas crenças pois a GE está fazendo exatamente isso, ou seja, mantém o que funciona e testa novos modelos, novos negócios, com uma nova equipe e basicamente num modelo de startup, apartada do tradicional.

Não tenho todas as respostas e não sei se o modelo que acredito é realmente o melhor, mas acredito sim que a educação de adultos de qualidade pode e deve ser planejada e desenvolvida com uma visão exponencial e um propósito massivo transformador de levar melhoria de qualidade de vida a todos os brasileiros. E não tenho dúvida que a instituição que buscar e encontrar esse caminho se tornará referência em nosso país.

Finalmente, o que acho importante é que pensemos e planejemos o que e como será a educação do amanhã, pois de outra forma não estaremos exercendo plenamente nosso papel de criar um país novo, mais humano, mais justo e mais produtivo.